A igreja é o corpo de Cristo formado por todos aqueles que o aceitaram. Portanto, a igreja somos nós, e é de todos.
É na igreja que o Espírito Santo derrama seus dons. Deus faz acepção de pessoas ao distribuí-los? Existem dons exclusivos aos homens ou às mulheres, aos adultos ou aos mais jovens? Não há evidência bíblica para isso. Permitir a participação é uma oportunidade para que todos os dons se manifestem.
Sacerdócio universal (Ap 1.6)
De certo modo, todos os crentes são sacerdotes e profetas. Corrie Ten Boon, após a guerra, abriu um orfanato para crianças com incapacidades. Uma dessas crianças definiu, com suas palavras, o que é um sacerdote e um profeta: “Um sacerdote é alguém que fala com Deus sobre os seres humanos. Um profeta é quem fala aos seres humanos sobre Deus”.
Abrir espaços de participação é uma oportunidade para exercer o sacerdócio universal dos crentes. Levar a Deus o sofrimento do nosso próximo e anunciar as boas novas é desafio de todo cristão.
O que diz a Bíblia?
A participação não é modismo. O protagonismo infantil é algo importante na Bíblia. Um bom resumo de alguns casos do Antigo Testamento está no capítulo 7 do documento “As meninas e os meninos no propósito de Deus”.
Exemplos:
– Deus fala através de uma criança (1 Sm 3.1-21)
– Uma menina intervém na cura de Naamã (2 Rs 5.2-3)
– Um menino no centro da promessa messiânica (Is 9.6)
– As crianças são convocadas a participar na missão do povo de Deus (Jr 1.6)
– As crianças presenciam importantes episódios de reconciliação (Gn 33.1-7)
– São incluídas nos pactos de Deus (Gn 33.12-15; Ex 19)
– São consagradas desde muito pequenas para servir a Deus (1 Sm 1.22-28)
– Um é nomeado rei aos oito anos de idade (2 Rs 22.1
– Deus elegeu uma adolescente inesperiente para trazer Jesus ao mundo.
– Jesus, quando era criança, era ativo, inquieto e com entendimento espiritual e bíblico (Lc 2.19).
– As crianças gritam e louvam a Jesus, incomodando as autoridades. (Mt 21.15-16)
Os pequeninos são atores de transformação e protagonistas do reino de Deus. Eles cumprem tarefas sacerdotais, proféticas, de serviço, de denúncia, etc.
Considerações sobre a participação
A igreja deve ser uma comunidade de integração social. Um dos principais males é a exclusão: deixar de fora ou silenciar o outro por sua raça, seu sexo, sua idade ou sua nacionalidade. Abrir espaços de participação é uma oportunidade à inclusão social.
A participação é um processo cultural que visa incluir. Há elementos da cultura de um povo que facilitam a participação, mas há outros que a dificultam. É um desafio fazer um estudo comparado de diferentes contextos culturais e de como se dá ou não a participação das crianças nessas comunidades.
Aprende-se a participar na família, na escola, na comunidade. É um processo gradual em função da idade e do nível de desenvolvimento. A forma de participar do bebê é diferente da de uma criança maior, de um adolescente, de um jovem ou de um ancião.
A participação enquadra-se em uma estrutura de poder. O processo de inclusão social através da participação, cedo ou tarde, se confrontará com o tema do poder.
Como dizem, a igreja é “adultocêntrica”. Porém, acho que, muitas vezes, ela também é “varãocêntrica” ou “pastorcêntrica” ou “missionáriocêntrica”, etc. Falamos de uma estrutura de poder determinada, que valoriza mais certas características que outras na vida dos membros de uma igreja. Na verdade, não encontramos esse problema apenas na igreja, mas também em outras comunidades e famílias. Não podemos nos conformar. A igreja é chamada a ser um contra-modelo e a encarnar os valores do reino em toda cultura.
A participação deve começar nos grupos sociais mais básicos. Se esses lugares (família, escola, etc.) não abrem espaços adequados para se aprender a participar, então é ainda mais pertinente que a igreja possa ser um lugar onde, vivendo de forma diferente, o poder é compartilhado e as sementes do reino são plantadas. Se quando fazemos um almoço comunitário podemos cozinhar e lavar juntos (homens, mulheres e crianças), estamos, com pequenas coisas, construindo grandes relações.
A igreja deve ser uma escola de participação onde a diversidade é celebrada.
Não é anarquia, nem promoção de uma postura simplista do tipo: “as crianças ao poder” ou do “criançacentrismo”. Quando Jesus põe uma criança no centro como modelo do reino, ele questiona o conceito de poder dos seus discípulos e os convida a uma experiência integradora, onde os menores são a prioridade de tal maneira que ninguém fique de fora (Mt 18.1-5).
A igreja pode ser um espaço de encontro onde se desenvolve experiências de protagonismo e participação entre gerações, raças e culturas. Um ambiente onde a diversidade é vivida como riqueza e como anúncio do reino.
Autor: Luis Antonio Cesari, coordenador de programas da Juventud para Cristo, no Uruguai