Re-visitaria com prazer:
Celebrações de Natal em Tacaratu, PE. Meu pai colocava lâmpadas coloridas na castanhola na frente da nossa casa. Admito que elas davam um ar brega para a nossa casa, mas continuo lembrando delas com carinho e alegria. Dois caminhões cheios de pessoas cantando louvores na maior altura chegavam para o culto de Natal. Um grupo vinha da aldeia Pankararu, o outro do distrito vizinho chamado Caraibeiras.
Cantar a pleno vapor o hino “Senhor meu Deus, quando eu maravilhado, fico a pensar nas obras de tuas mãos” ocupa o topo das minhas memórias natalinas. A igrejinha ficava abarrotada. Tão cheia que, certa vez, eu fiquei acanhada de vestir as asas do Anjo Gabriel, confeccionadas por minha mãe com folhas de isopor e papel crepom. Minha mãe me convenceu de ser um anjo sem asas e com minhas roupas normais na peça de teatro. Este Natal ganha o troféu de “O Mais Saudoso”.
Pularia se fosse possível:
Uma das celebrações de Natal que eu pularia, como uma página suja no meu livro de memórias, foi uma na qual nossa família estava de mudança para São Bernardo do Campo, SP. O local onde fomos morar era o menor espaço já ocupado por nossa família e estava inacabado.
Não conhecíamos ninguém e meus pais estavam sem recursos para comprar comidas especiais. Comemos um frango assado comprado na padaria da esquina. A visita do nosso tio foi bem vinda até descobrirmos que ele tinha trazido um presente para apenas uma de suas quatro sobrinhas! O título deste é “O Mais Pobre”.
E aí tem também o Natal que ganha o troféu de “O Mais Estressante” no qual eu me vi numa roda viva, esbaforida, correndo de uma família a outra, saindo de uma situação de estresse para outra sem nenhuma pausa para respirar. Estava nos Estados Unidos, casada, com filhos pequenos, me sentindo inadequada e em choque cultural!
Mas, minha lista não ficaria completa sem “O Mais Triste”. Quantos de nós teve de encarar um Natal no qual a ausência de um ente querido suga toda a nossa energia emocional? Na nossa família, isto aconteceu em 1995, quando meu pai passou o almoço de Natal no sofá, segurando a dor para não acabar no hospital. Ele estava na fase final do câncer e todos nós sabíamos que o fim estava próximo. Foi um Natal de luto antecipado.
Neste ano, muitos de nós estarão passando o primeiro Natal sem a presença de um parente querido. E isto dói!
Como lidar com tantas memórias que vamos acumulando na nossa alma?
Eu prefiro seguir o caminho da manjedoura. A narrativa tão antiga quanto o Cristianismo renova minha alegria acima das luzes das festas. Ela me traz consolo quando minhas circunstâncias são tão humildes quanto as de José e Maria naquela noite em Belém. Ela me compele a parar e contemplar o Deus Presente, quando ao meu redor o mundo segue seu ritmo frenético e pobre de significado.
E, por fim, ela me ajuda a lembrar que o Deus Menino cresceu e dedicou a sua vida para que a morte hoje não tenha mais o poder absoluto sobre mim nem sobre as pessoas ao meu redor.
Neste Natal pratique comigo a simplicidade, a leveza da chegada do Deus Menino na História da humanidade e na sua caminhada de vida.
Coordenadora da Rede Mãos Dadas. Casada com James Gilbert, mãe de três filhos e de uma filha.